terça-feira, 13 de julho de 2010

Acessibilidade para todos

Foto: Carlos Eller/EM/D.A. Press

Como uma característica do urbanismo, das edificações, do transporte e dos sistemas e meios de comunicação sensorial que permite seu uso por qualquer pessoa, independentemente da condição física, psíquica ou cultural, o conceito de acessibilidade se insere como uma premissa na construção civil para respeitar a individualidade, suprimindo estigmas e promovendo integração. Neste contexto, a ideia do desenho universal, originada na década de 1980, define projetos de produtos e ambientes que possam ser utilizados por todos, em sua máxima extensão possível, sem necessidade de adaptação. Diante dos atuais incentivos ao setor da habitação de interesse social no Brasil, surge a demanda para levar a acessibilidade para o universo da população de baixa renda, de forma incorporada desde o início do projeto, para que a moradia popular possa também oferecer dignidade e qualidade de vida em qualquer caso de dificuldade motora, em um cenário em que reformas para adaptar esses imóveis representam custo alto para quem tem condições financeiras precárias. E as soluções podem vir em detalhes simples."A necessidade de promover a acessibilidade para pessoas com recursos econômicos escassos chama a atenção. Apesar da reserva de uma parcela das contruções populares para aqueles com limitações de mobilidade previstas em programas habitacionais, essas medidas ainda são insuficientes e muitas vezes não alcançam a totalidade dos problemas. O desenho universal oferece autonomia e independência dentro da própria casa, condições de gerir a vida, liberdade de usar todos os cômodos. Qualquer pessoa está sujeita a sofrer uma limitação, não só os deficientes, mesmo que ocasionada ou temporária, e até o próprio envelhecimento. É preciso eliminar o preconceito, perceber que isso não é anomalia, e sim diversidade, outras formas de viver", pontua a designer de ambientes especialista na área, Flávia Lima. Para a população de baixa renda, é ainda mais complicado modificar os espaços (que nas moradias populares são bastante reduzidos) e, quando isso acontece, geralmente é feito em regimes de auto-gestão, sem orientação profissional, continua a designer.
Englobando questões como a acessibilidade, a adaptabilidade, a estética, o conforto e a segurança, em sete princípios básicos, o desenho universal permite que o ambiente seja flexível em todo o ciclo de vida de uma pessoa e em qualquer situação permanente ou temporária de dificuldade de mobilidade e, como comprovam levantamentos, se incorporado desde o início da construção, traz a vantagem de um custo mais baixo do que adaptar o imóvel posteriormente, continua Flávia. "Espaços não adequados comprometem a liberdade, tolhem as possibilidades de escolha dentro do lar, e isto dentro de um novo modelo de moradia que, entre outras coisas, diminui cada vez mais a área interna dos imóveis. Para esta faixa da população, os projetos pouco acessíveis se tornam verdadeiramente um problema social que não é assistido de maneira efetiva pelo poder público. Pensar nisso não é custo, é investimento que se aproxima de uma leitura mais completa do ser humano, garantindo antes sua dignidade para depois alcançar a melhoria da qualidade de vida".
Portas e passagens mais largas, pisos sólidos, apropriados, regulares e antiderrapantes nos locais molhados, luz de vigília e balizadores, rampas e barras de apoios e proteção, caminhamento livre, escadas com largura mínima de degraus, interruptores e tomadas em locais adequados, são alguns elementos básicos para projetos de construção para a inclusão de pessoas com baixa mobilidade e outras limitações. Cada recinto deve ter soluções que consideram todas as probabilidades futuras de desenvolvimento para cada pessoa, sua respectiva cultura, modelo emocional, deficiências físicas, riscos naturais, entre outros aspectos, como frisa a designer.
"Em geral, a norma é respeitar o mínimo de 80 cm dos vãos para portas em todos os locais da casa, espaços de circulação como corredores, em banheiros, cozinhas, quartos, áreas de serviço, obrigatoriamente suficientes para uma pessoa em uma cadeira de rodas ou de muletas. As passagens também devem ter menos labirintos, e é bom que piso e parede tenham cores contrastantes, o que, com a perda da acuidade visual evita, por exemplo, que os idosos trombem nas paredes. Mudando a cultura capitalista da especulação imobiliária, observar entre esses aspectos o mínimo que seja digno em habitações de interesse social já é uma grande mudança que ampliaria o alcance além daquela pequena parcela reservada", destaca Flávia.
Modelos
Em Uberlândia, no Triângulo Mineiro, um exemplo de esforço neste sentido está no trabalho da vereadora Liza Prado (PSB), que já elaborou projetos de lei e modelos acessíveis para casas populares e, mesmo enfrentando falta de apoio político, vem fomentando a discussão entre entidades envolvidas com o setor da habitação a fim de ganhar adeptos, trabalhando diretamente na realidade das comunidades carentes. A vereadora protocolou requerimento para a Secretaria de Habitação e a Caixa Econômica Federal solicitando que, para a construção das casas populares, fosse levado em conta as regras do desenho universal. "Dentro de uma nova forma de perceber o significado da moradia, a arquitetura hoje é uma forte aliada para ajudar a resolver os problemas de espaço urbano, e principalmente para melhorar a qualidade da habitação popular. É preciso avançar para democratizar este direito, mas com qualidade de vida", enfatiza. Além da lógica de fomentar o setor imobiliário gerando emprego e renda, que muitas vezes tem caráter mercadológicoe quantitativo, Liza atenta para a necessidade de ter conforto e infraestrutura que considere o ser humano.Acompanhando algumas obras em conjuntos habitacionais, ela pôde perceber as dificuldades para quem precisa quebrar paredes, por exemplo, e ainda diante de instrumentos que estão diminuindo e limitando a área dessas casas, em torno dos 50 metros quadrados. "Considero um avanço a ideia do design que universaliza o conceito da habitação, comprovando que alguns detalhes simples podem facilitar a vida. Precisamos entender que esta questão do conforto não pode ser apenas para alguns iluminados que podem pagar. Temos que começar a promover conceitos efetivos de acessibilidade, partindo do poder público que, no meu entender, deve ser o primeiro a investir na qualidade da habitação popular, como uma exigência para mostrar às empresas e construtoras que elas devem se preocupar com isso em todos os tipos de empreendimentos", completa Liza Prado.

Fonte: Joana Gontijo/Portal Lugar Certo

Nenhum comentário:

Postar um comentário